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sexta-feira, 18 de setembro de 2009

A garota do 08.

Ele se escondeu embaixo da escada, e ficou ali, parado, só esperando. Mais cedo ou mais tarde, ele sabia, ela desceria por ali. E, sim, ele sentiria um prazer inconcebível somente por poder vê-la de relance. Esse era o problema de amar do jeito que ele a amava. Qualquer coisa que acontecesse era motivo de comemoração. Uma rápida troca de olhares, o odor de perfume oriental que escapava do quarto onde ela dormia, os livros que ela esquecia sobre a mesa da sala de estar, e que a senhoria esquecia-se de lhe devolver. Tudo que o fazia lembrar-se dela, chegava ao seu coração em forma de vibrantos. Ele era o que se podia chamar de melhor exemplo de amante platônico.

O dias mais felizes de sua vida, lembrava bem, foram ali, durante o verão passado. Ela gostava da estação do calor, deixava pra usar suas roupas mais leves, coloridas e juvenis naquela época. E céus, como ela poderia imaginar como aquilo o atormentava ? Às vezes ele tinha que fingir que não percebia o clima da sala mudar, quando ela entrava carregando os buquês que montava com as crianças da vila. Oras, o problema de se morar numa pousada como aquela, era que todos estavam aptos a perceber as suas menores nuances de humor. E ele certamente não desejava que ninguém soubesse o sentimento que nutria pela bela garota do quarto 08. Sentia um temor enorme que todos descobrissem aquilo tudo, que se aglomerava dentro do seu corpo. Achava que morreria, que aquilo tudo haveria de implodir, se ela soubesse o que se passava, e lhe dissesse que não. Que não o amava.
Era por isso que ele tinha que se contentar com poucos segundos, tinha de ser feliz como dava. Comendo a banda de maçã que ela deixava dentro da geladeira, ou roubando as flores que ela trazia pra dentro de casa. Lendo os livros que ela deixava soltos pelos corredores. Admirando, escondido, os trechos de músicas dos Beatles, que escapavam para o seu próprio quarto, com o abrir e fechar da porta do 08. Ou simplesmente vendo seus tornozelos de relance por entre o vão da escada. Como hoje. Como quando ela passou e ele pôde ver seus pés sujos de terra. Soube imediatamente que ela estivera lá fora, com as crianças de novo. E por uma razão que ninguém jamais compreenderia, nem mesmo ele, chorou ao perceber que seus pés estavam ali, tão perto e tão longe. Sujos de terra, mas limpos dos seus toque apaixonados. Ele chorou.

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