qualquer coisa grite meu nome:

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Café da manhã para um, por favor.

if sadness is a hunter, you are the hunted. be smart and get away with your own hands
      Ela acordou. Seu braço esquerdo por sobre o rosto. Era visível o quanto havia se mexido de noite: todos os lençóis e travesseiros e almofadas e tudo o mais que havia na cama bagunçado. Inclusive ela, por dentro.
      Sentou e pôs um dos pés no chão. De certa forma era frio, mas ela não ligava porque nada poderia ser mais frio do que a ausência que sentia. Calçou suas velhas pantufas, cinzentas pelo descaso do tempo e da dona. Foi para a pequena cozinha do apartamento velho, que agora era só seu e de mais ninguém. Tratou de por o café no fogo, nada mais no mundo lhe dava a energia que precisava, não mais.
      O céu lá fora era daquele tipo amarelado que outrora a convidava a sair e se divertir, ler livros nos sebos, andar pela cidade, gastar as botas. O tipo de coisa que ela aprendera com seus ídolos de papel, Kerouac, Bukowski, Ginsberg, essas coisas. Mas hoje não. Hoje era insuportável pensar em sair de casa e encarar as outras pessoas lá fora. Todos aqueles casais que se divertiam, aquelas famílias, em todos os cantos do mundo pessoas que lembravam que agora ela estava só, que não tinha mais uma ligação. Tudo isso doía e por isso ela não saía.
      A água ferveu, o café foi coado, ela encheu a xícara vermelha que ganhara no natal e foi para a sala, se jogou no sofá. Ficou um tempo olhando o céu, refletindo sobre a vida. Bebendo seu café. E então ela desistiu de esperar que o sentimento fosse embora, era melhor aprender a conviver com as coisas que haviam ali dentro dela. Deixou o café sobre a mesa, foi para o quarto e se vestiu decentemente pela primeira vez em cinco dias de solidão absoluta.
      Pôs sua calça jeans mais surrada, a que um dia havia sido dele, e uma blusa qualquer e as indefectíveis botas vermelhas e sorriu. O primeiro sorriso realmente espontâneo em alguns meses. Pegou as chaves de sua moto, passou pela sala e matou o último gole de café. Parou por um instante, tempo suficiente para ver uma das fotos que ainda estavam ali, uma foto dos dois juntos e rindo, um fragmento da velha felicidade que estava lá no começo de tudo. A felicidade que ela achava que ainda podia sentir, simplesmente por tê-lo tido um dia.
             - Meu amor, me desculpe por desistir de nós dois, mas hoje eu decidi aprender a levar minha vida sem você.
      Beijou a foto e saiu pela porta, em direção à um novo horizonte...

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